terça-feira, 18 de março de 2008

Dia do Pai

Já não tenho pai, mas faz-me falta......transcrevo este texto do José Luis Peixoto, que acho lindissimo .Foi o primeiro livro deste autor, intitulado ''Morreste-me'' e foi-me oferecido no ano 2000,ano em que o meu pai morreu.É um livro pequenino que vale a pena ter à cabeceira, é pena estar esgotado!!! Pai há só um, por muitas voltas que queiram dar ao ''texto''...acho eu!! Se quando perdemos os nossos pais, nunca mais os esquecemos, não são os tribunais que irão fazer esquecer o pai ou a mãe..... disso não tenho dúvida!
Morreste-me (excerto)
Pai. A tarde dissolve-se sobre a terra, sobre a nossa casa. O céu desfia um sopro quieto nos rostos. Acende-se a lua. Translúcida, adormece um sono cálido nos olhares. Anoitece devagar. Dizia nunca esquecerei, e lembro-me. Anoitecia devagar e, a esta hora, nesta altura do ano, desenrolavas a mangueira com todos os preceitos e, seguindo regras certas, regavas as árvores e as flores do quintal; e tudo isso me ensinavas, tudo isso me explicavas. Anda cá ver, rapaz. E mostravas-me. Pai. Deixaste-te ficar em tudo. Sobrepostos na mágoa indiferente deste mundo que finge continuar, os teus movimentos, o eclipse dos teus gestos. E tudo isto é agora pouco para te conter. Agora, és o rio e as margens e a nascente; és o dia, e a tarde dentro do dia, e o sol dentro da tarde; és o mundo todo por seres a sua pele. Pai. Nunca envelheceste, e eu queria ver-te velho, velhinho aqui no nosso quintal, a regar as árvores, a regar as flores. Sinto tanta falta das tuas palavras. Orienta-te, rapaz. Sim. Eu oriento-me, pai. E fico. Estou. O entardecer, em vagas de luz, espraia-se na terra que te acolheu e conserva. Chora chove brilho alvura sobre mim. E oiço o eco da tua voz, da tua voz que nunca mais poderei ouvir. A tua voz calada para sempre. E, como se adormecesses, vejo-te fechar as pálpebras sobre os olhos que nunca mais abrirás. Os teus olhos fechados para sempre. E, de uma vez, deixas de respirar. Para sempre. Para nunca mais. Pai. Tudo o que te sobreviveu me agride. Pai. Nunca esquecerei.

quinta-feira, 6 de março de 2008

A minha dúvida....é a minha angústia

Quando se tem na familia ou mesmo alguém amigo, alguém doente, seja com défice cognitivo,seja uma doença terminal,seja uma doença neurológica, faz-nos ser diferentes e olhar o mundo de maneira diferente.Não somos todos iguais e ao ficarmos diferentes e olhar esse ''mundo'',por vezes tornamo-nos piores do que já éramos anteriormente.
O Shakeaspeare dizia que o mundo era um palco, e deveria ter razão, porque era um homem muito culto, mas não podemos querer estar sempre na ribalta e ser aplaudidos!!!!!
Ao tomarmos uma decisão, estamos a fazer uma escolha e como tal podemos errar ou não,mas decidir é melhor que não decidir nada,acho eu!!!!
A minha decisão é procurar uma escola para a minha filha,que tenha internato, porque eu e o pai, podemos ficar doentes de um momento para o outro ou morrermos,pois é o que temos certeza absoluta nesta vida.
Até agora não consegui, fico à porta da escola e olho para aquilo, como uma prisão, onde a minha filha, que não é autónoma irá ficar, quando desaparecermos!!!!! É superior a mim, choro que me farto e depois penso:para a semana vou marcar uma entrevista.......Qualquer dia, para a semana...pode ser tarde!!!
Penso que o melhor era andarmos cá muitos anos com saúde e a minha menina ''partir'', uns minutitos ''antes'', mas este pensamento também me deixa ficar triste.
Todos os psicólogos com quem falei e continuo a falar sobre este assunto dizem-me: Esse seu desejo é um acto de amor, só quando se ama muito um filho,nestas circunstâncias, se pode pensar assim...
Mas será que é justo pensar assim?
A minha dúvida.....é e será sempre a minha angústia!